16 agosto, 2007

O direito à vida

Como foi apresentado em “Ética e direitos”, o direito à vida é o reconhecimento do fato de que, para viver conforme sua natureza, o ser racional precisa pensar e agir de acordo com suas próprias escolhas. Em uma sociedade em que está exposto a ser morto por qualquer um, o homem é reduzido ao estado de um animal – que sobrevive apenas enquanto for capaz de fisicamente superar seus predadores e concorrentes.

O entendimento claro do direito à vida requer saber que os verdadeiros direitos representam limitações à ação de outros, nunca obrigações para que eles ajam. É por isso que não existe conflito entre os direitos de uma pessoa e das outras com quem convive. Uma definição clara do direito à vida é:

O direito à vida é o direito a não ter sua vida tirada pela ação de outro.

Há um ponto fundamental a ser destacado. O direito é expresso como uma negativa, e não por acaso. O direito à vida não obriga os outros a fazer qualquer coisa – apenas garante ao indivíduo que outros não agirão de forma a tirar sua vida. Em outras palavras, o direito significa que o indivíduo deve estar livre da ação de outros contra sua vida – não que os outros são obrigados a agir para que ele continue vivo.

Seguem alguns exemplos para ilustrar o conceito, primeiro casos em que há violação do direito à vida e em seguida casos em que não há.

Quando alguém mata outra pessoa intencionalmente, por qualquer motivo que não defender-se ou a um terceiro de um crime (violação do direito à vida, propriedade ou liberdade), ocorre violação do direito à vida. Este é o caso mais claro e inequívoco. Um assassinato passional, matar outra pessoa “em defesa da honra” e latrocínio são todos exemplos deste caso. Este caso é chamado homicídio doloso.

Quando alguém, como resultado de uma ação sua, causa a morte de outra pessoa mas não tinha intenção de matar, há duas possibilidades. Se o fato de que aquela ação poderia levar ao prejuízo da vida de alguém era previsível na situação em que se encontrava o culpado, houve violação de direito. Jogar um objeto pesado da janela de um prédio sem olhar para baixo matando outra pessoa, dirigir bêbado e atropelar alguém, despejar um produto tóxico em um rio e acabar causando mortes são exemplos deste caso. Este caso é chamado homicídio culposo.

Se a consequência fatal era imprevisível no momento da ação, não houve violação de direito. Um exemplo deste caso seria se ao tomar o elevador para o subsolo uma pessoa acabasse esmagando um técnico que estava dentro do fosso do elevador e esqueceu de desligá-lo. Este caso é chamado morte acidental.

Se alguém está morrendo de fome, um indivíduo se recusa a dar-lhe comida, e a pessoa morre – não há violação de direito. O faminto morreu em consequência da inação do indivíduo, não de sua ação. Recusar-se a salvar a vida de alguém é fundamentalmente diferente de matá-lo – embora a ética religiosa pregue o contrário. Como os seres humanos são indivíduos independentes, ninguém tem a obrigação de sustentar o outro. Na maioria dos casos é vantajoso fazê-lo, mas nunca é uma violação de direito recusar-se.

Não dar comida ao faminto, não dar remédio ao doente, não pular no rio para salvar quem está se afogando, não entrar em um prédio em chamas para salvar alguém – todos estes são exemplos de inação que pode levar a uma morte. Nenhum deles é uma violação de direitos. Não há obrigação moral de sacrificar sua própria vida ou propriedade para salvar a vida de outro. A opção por salvar aquela pessoa deve se basear no fato de que aquela vida é, ou pode se tornar, valiosa para si. Não há obrigação de fazê-lo.

Assim como recusar ajuda, interromper uma ajuda previamente praticada também não viola o direito à vida. Se alguém pratica caridade, e decide parar, não pode ser culpado por sua inação. Fazer caridade não cria a obrigação de continuar a fazendo.

O fundamento por trás de todos estes exemplos é o mesmo que embasa o próprio conceito de direitos – a ética racional. Seres humanos são independentes e racionais. Cabe a cada um prover para sua própria vida, ninguém tem obrigação de sustentar outros. Mas é vedado a todos agir contra seus semelhantes, negando lhes as liberdades que os permitem viver independentemente.