22 fevereiro, 2008
Espectro político: Estados Unidos
Nos EUA há dois partidos majoritários, o partido Democrata e o partido Republicano. Não é proibido criar outros partidos e, diferente daqui, nem é preciso pertencer a um partido para se candidatar. Pode-se concorrer como “independente” – e nas esferas locais às vezes os “independentes” são eleitos.
O partido Democrata é um partido de esquerda. A plataforma do partido consiste em aumentar os programas governamentais de assistência (previdência, saúde, educação etc), além de expandir a interferência estatal na vida econômica. O partido Democrata americano é o partido que defende a regulamentação, as barreiras comerciais e a taxação das empresas como caminho para a prosperidade.
Socialmente o partido Democrata historicamente é defensor das liberdades civis como a união civil de homossexuais e do direito ao aborto (que existe nos EUA). A base de sustentação do partido Democrata são os sindicatos (especialmente os sindicatos de funcionários públicos), os ativistas das “minorias” e seus simpatizantes.
O partido Republicano é um partido de direita, conservador. A plataforma histórica do partido é a preservação do sistema econômico americano tradicional: a liberdade econômica. Os Republicanos são tradicionalmente defensores da diminuição da interferência do governo na vida econômica, sendo contra barreiras comerciais e a favor da limitação dos programas assistenciais. A redução de impostos é uma bandeira tradicional do partido.
Socialmente o partido Republicano defende a moral cristã, e tem na Igreja seu principal pilar de sustentação. Os Republicanos costumam se posicionar contra a união civil de homossexuais, contra o direito ao aborto e contra a pesquisa científica com embriões humanos, por exemplo.
Para compreender o cenário americano, é preciso relacionar o posicionamento destes partidos em relação às forças políticas que conhecemos no Brasil. Esta comparação pode ser feita identificando princípios e posições defendidos por Democratas e Republicanos e comparando com o que se tem aqui.
Em primeiro lugar, vamos posicionar a esquerda americana. O partido Democrata é sustentado por sindicatos, principalmente os do funcionalismo público. No Brasil o PT e seus aliados detém este posicionamento.
Nos EUA a filiação a um sindicato é opção de cada um, enquanto no Brasil é obrigatória. Nos EUA qualquer grupo pode criar um sindicato, inclusive vários para a mesma área. No Brasil só pode haver um para cada atividade, e o governo escolhe qual é o “legítimo”. Obrigar o cidadão a ser representado por um sindicato e proibir que as pessoas se unam livremente em sindicatos diversos seria considerado uma interferência ilegítima na vida do cidadão – mesmo por um Democrata.
O partido Democrata americano é a favor da interferência do governo na economia. No Brasil, todos os partidos são – em maior ou menor grau. O modelo dos Democratas americanos, no entanto, é o da regulamentação e taxação e não do controle direto. Defendem que o governo deve determinar o que e como se pode produzir, bem como controlar preços e garantir que não há “abusos”, mas num contexto de iniciativa privada.
O partido Democrata americano defende um regime econômico que preserva a iniciativa privada – apenas dá ao governo a prerrogativa de colocar sela e cabresto nesta iniciativa e virá-la na direção que acha melhor (em vez de deixar as pessoas fazerem o que elas acham melhor). Esta postura é similar ao ideal defendido por nossa esquerda “light”, PSDB, DEM e seus aliados.
O partido Democrata, portanto, se situa próximo aos nossos PSDB e DEM no espectro político. Embora represente a extrema esquerda americana, o princípio da liberdade individual (sobre o qual os EUA foram fundados) ainda permeia o partido Democrata.
É curioso que partidos chamados “Democratas” no Brasil e nos EUA estejam na mesma região do espectro político, embora representem nossa extrema “direita” e a extrema esquerda deles.
O partido Republicano não tem equivalente na política brasileira. Seus princípios econômicos – que cada um é responsável por sua própria prosperidade e que ao governo cabe apenas estabelecer as regras do jogo (sem tentar definir quem ganha) – não encontram par no Brasil. Aqui todos os partidos estão engajados em ajudar alguém às custas de outro.
Na política social também não temos algo parecido com o conservadorismo americano. Para se tomar referência, um dos pré-candidatos Republicanos afirmou que era necessário reescrever a Constituição dos EUA para adequá-la à Bíblia. Embora a Igreja Católica seja muito influente no Brasil, ela não determina a posição de partidos brasileiros como ocorre com o partido Republicano.
Isto provavelmente ocorre por dois grandes motivos. Em primeiro lugar, no Brasil já não existe direito ao aborto (certamente a questão mais controversa nos EUA). Caso houvesse, é provável que a questão se tornasse uma bandeira política e trouxesse a religião para dentro do debate.
Em segundo lugar, por aqui a Igreja é aliada de partidos de extrema esquerda, que têm uma tradição de políticas sociais liberais. No Brasil a Igreja parece ter decidido que é mais importante forçar o indivíduo a fazer caridade (usando o governo para tirar seu dinheiro à força e dar a outro) do que defender suas posições sociais.
O partido Republicano, portanto, representa uma defesa da liberdade econômica sem comparação no Brasil, bem como uma mistura de preceitos religiosos na política que também não tem par nos partidos brasileiros majoritários.
Como visto em “Nem direita, nem esquerda” não devemos invejar o conservadorismo americano por ser de direita. A interferência do estado na vida social não é boa – seja inspirada pela religião ou não. O invejável é que existe uma força política que defende o que é certo na vida econômica: o Capitalismo.
Tomando a metade boa do partido Democrata americano (sua política social) e a metade boa do partido Republicano (sua política econômica), tem se os elementos do que é a política correta para a vida em sociedade: a liberdade individual. São estas boas influências que mantém os EUA avançando a passos largos – e a ausência da “parte boa” na política econômica do Brasil que nos mantém eternamente atrasados.
11 fevereiro, 2008
Esquerda ou esquerda?
A essência de cada uma destas correntes políticas é a interferência do governo na vida do indivíduo. O esquerdista demanda a interferência do governo na vida econômica, o conservador a demanda na vida pessoal. As expressões práticas atuais destas correntes políticas, no entanto, não são igualmente ruins.
A despeito da ruína econômica e dos assassinatos em massa protagonizados por todos os governos que colocaram em prática os princípios da esquerda, a esquerda moderna continua fiel a estas idéias venenosas.
O conservadorismo cristão, no entanto, reflete séculos de amadurecimento da igreja cristã. O cristianismo, para sobreviver nestes tempos de ciência, foi obrigado a se adaptar. Esta adaptação é feita através do “recuo tático”, da re-interpretação da doutrina religiosa a cada vez que a razão demonstra sua falsidade.
Meros 400 anos atrás, a Igreja Católica ameaçava a vida de Galileu por ousar dizer que a Terra se movia em torno do Sol. Isto contradizia frontalmente a Bíblia, era portanto impossível. Hoje todos sabem que Galileu estava certo, mas conclui-se então que a Bíblia está errada? Não, as passagens que antes enchiam os teólogos de certeza científica hoje são consideradas metafóricas.
O mesmo vale para a lenda da criação. Hoje poucos realmente acreditam que o planeta foi criado em seis dias. Mas a história da Bíblia está errada? Não, hoje ela é considerada uma metáfora – um “dia” pode querer dizer alguns milhões de anos, certo?
Embora este constante recuo frente à razão e à ciência diga algo muito importante quanto à veracidade daquilo que prega o cristianismo, não é isso que interessa ao se analisar a influência desta religião na política. O fato é que esta postura de “sobreviver não confrontando a razão” torna o cristianismo uma religião capaz de conviver com um sistema político livre. A comparação com o islamismo mostra o quanto isto é importante.
O conservadorismo cristão, portanto, não defende a imposição política da ética cristã exceto em assuntos específicos. A direita combate o direito ao aborto e a pesquisa científica com embriões – mas não tenta impor politicamente a caridade nem o “ame seu inimigo” (ambos fundamentos da ética cristã). A conclusão é que o conservadorismo hoje defende uma política que dá muito mais liberdade ao indivíduo que qualquer vertente esquerdista.
A verdadeira liberdade não encontra expressão significativa na política de hoje. Nos Estados Unidos existe um Partido Libertário – mas este não é fundamentado em princípios claros como os da esquerda e os dos conservadores. O partido congrega desde verdadeiros liberais até “anarco-socialistas”, entre outras maluquices. O ideário se resume a “precisamos diminuir o governo”, sem idéias claras sobre quanto nem porque fazê-lo.
No Brasil não existe força política que não seja de esquerda. Os dois principais partidos políticos, PT e PSDB, são explicitamente de esquerda. O PMDB também é um partido de esquerda. Em seu programa lê-se “O PMDB pretende continuar sendo a expressão política da maioria da população brasileira, oprimida e explorada por um regime econômico voltado para a satisfação de uma pequena maioria (...)”. Marxismo puro.
Afora os partidos de aluguel – que nem se pode dizer que tenham uma política – e os satélites do PT (que inclui, ironicamente, o “Partido Liberal”), resta o partido Democratas, o antigo PFL.
O PFL é historicamente um partido de esquerda. Foi componente dos governos Fernando Henrique Cardoso, apoiando a criação de muitas das atuais ferramentas de redistribuição de riqueza e o aumento do peso do estado que ocorreu neste período. Em sua reinvenção como Democratas, o partido preserva um núcleo de esquerdismo.
Em sua declaração de princípios lê-se: “(...) há problemas e desigualdades que não podem ser satisfatoriamente resolvidos pelo livre jogo das forças de mercado”. Ou seja, as pessoas não podem ser realmente livres. O item seguinte é mais claro: “Afirmamos a prevalência do interesse social sobre o individual”.
A pesar destes fundamentos esquerdistas (achar que a liberdade econômica “não funciona” e subordinar a liberdade individual ao “interesse social”), a declaração de princípios do partido Democratas também demonstra uma tendência positiva: “(...) a grande revolução a realizar-se neste País é a da liberdade da iniciativa em todos os planos - no político, no social e no econômico”.
É evidente que esta última afirmação contradiz os princípios anteriores – ou se tem liberdade ou se tem controle governamental. Mas o fato de que um partido defende que a solução para o país é reduzir o peso do estado já é uma novidade muito positiva no Brasil. Por seus princípios, os Democratas ainda são um partido de esquerda – mas o que defendem na prática representa muito mais liberdade do que as alternativas.
O espectro político brasileiro, portanto, é traçado entre a esquerda e a esquerda. De um lado a esquerda consistente, que leva a sério o ideal de igualdade material e a idéia de que para uma pessoa enriquecer outra precisa empobrecer. Nesta parte do espectro estão as alas “radicais” do PT e os demais partidos marxistas (PSOL, PCdoB, PCO etc).
Esta esquerda é favorável à interferência direta sobre a vida do cidadão. Apóiam a invasão de propriedade de gente honesta e inocente por “grupos sociais”, apóiam a censura contra a “mídia golpista” do Capitalismo. É o que Vargas Llosa chama de “esquerda carnívora”.
Do outro lado temos a esquerda pragmática. Esta esquerda é caracterizada pelo reconhecimento do fato óbvio que Comunismo não funciona. A contra gosto pregam uma mistura de interferência governamental e liberdade, veneno e alimento. Veneno suficiente para fazer alguma “justiça social”, mas liberdade suficiente para não matar o paciente.
As tendências “moderadas” do PT, o PSDB, o PFL histórico e o PMDB se distribuem nesta direção. Esta esquerda, por coerência, seria a herbívora – como disse Reinaldo Azevedo. Os Democratas ensaiam um movimento em direção à defesa da liberdade individual, mas ainda professam os princípios esquerdistas.

Não existe no Brasil tradição liberal, nem expressão política do liberalismo. Nunca existiu. Não existe também uma tradição conservadora, nem política “de direita”. O próprio termo “conservador” não faz sentido aqui. Foi criado nos Estados Unidos, onde havia uma tradição liberal cristã e onde havia aqueles que queriam conservá-la frente ao esquerdismo. No Brasil nunca houve tal coisa para ser conservada.
O Democratas ameaça trazer ao cenário a primeira expressão concreta do liberalismo, embora ainda entremeada de princípios de esquerda. Vale acompanhar a evolução do partido e de seu discurso, pois seria algo realmente novo na política nacional.
Até que isto aconteça, o espectro político no Brasil fica entre a esquerda e a esquerda. Pode se fazer distinção entre “esquerda carnívora” e “esquerda herbívora”, mas no fim das contas são todos quadrúpedes.
11 janeiro, 2008
Espectro político: Nem direita nem esquerda
A figura, convenientemente, apresenta à esquerda a condição que se tem quando o governo segue o ideário “de esquerda”. Reciprocamente, à direita da figura estão as condições típicas de regimes “de direita”.
Como visto em “Comunismo” e “Teocracia”, os extremos destas posições são respectivamente a escravidão econômica com liberdade pessoal plena e plena liberdade econômica com total opressão pessoal.
Este espectro político deixa muito clara uma verdade simples: a disputa entre direita e esquerda não é uma disputa entre o bem e o mal (nem entre o mal e o bem). É uma disputa entre o mal e o mal.
Tanto esquerdistas quanto direitistas querem usar o governo para controlar os indivíduos. Ayn Rand foi muito sagaz ao observar que cada qual faz questão de escravizar o indivíduo apenas na esfera que julga importante.
O esquerdista não se importa com seu comportamento, sua alma ou o que você faz entre quatro paredes. Mas seu trabalho e a riqueza que você produz – isto ele faz questão de controlar. Admita ou não, o esquerdista é um materialista. Ele só se importa realmente com dinheiro.
O direitista ou conservador, como prega o cristianismo, considera “este mundo” algo temporário e sem importância ante a “vida eterna”. Como “daqui não se leva nada”, ele não se importa com sua riqueza material.
Mas o direitista faz questão de interferir quando o assunto é com quem você faz sexo ou se você resolve que não quer ter um filho. Estas coisas, afinal, podem te mandar para o inferno. Admita ou não, o direitista é um místico. As posições que ele defende com tanta convicção são baseadas em nada além de dogma.
Ser escravizado por gente obcecada com o dinheiro (dos outros, é claro) ou ser o rebanho de gente que exige que nos comportemos como eles querem? Não é de surpreender que as pessoas considerem política algo inerentemente asqueroso, afinal as alternativas que se oferecem são a tirania ou a tirania!
O pior talvez sejam aqueles que tentam conciliar o mal com o mal. O esquerdista ao menos defende a liberdade pessoal. O direitista ao menos defende a liberdade econômica. O “centrista”, no entanto, é a favor de opressão tanto na vida pessoal como na econômica! Fundamentalmente é um totalitário – acha que o governo deve interferir em tudo.
Pode encontrar regimes à direita do espectro político tão ruins quanto os que se encontram à esquerda. A vida de uma mulher sob o islamismo, por exemplo, pode ser considerada tão ruim quanto a de alguém sob o comunismo.
Embora a mulher desfrute de liberdades econômicas com as quais a outra pessoa só pode sonhar, a outra pessoa possui liberdades pessoais com que ela sonha. Ambos são vítimas, a opressão apenas tem formas diferentes.
Só se pode dizer que uma situação é melhor que outra quando ela se situa para cima no espectro político. Transitar entre direita e esquerda só significa trocar uma coisa ruim por outra.
Embora esquerda e direita sejam duas opções ruins em seus princípios, nas formas que se apresentam hoje no Brasil e no mundo ocidental não são igualmente ruins. Em primeiro lugar, a esquerda não é uniforme, pode ser dividida grosseiramente entre a “esquerda consistente” e a “esquerda pragmática”.
Chamo de “esquerda consistente” àqueles esquerdistas cuja política reflete com fidelidade os princípios do esquerdismo: que igualdade material é o ideal de justiça e que só é possível enriquecer explorando o próximo.
Ora se o ideal moral é a igualdade, assistencialismo não é suficiente. É moralmente obrigatório que o governo seja muito mais eficaz em promover a igualdade. A estatização da vida econômica é a única forma de atingir este objetivo. O Comunismo é o objetivo da esquerda consistente.
A “esquerda pragmática” são aqueles esquerdistas com um pouco mais de contato com a realidade. Perceberam que o Comunismo causa miséria e assassinato em massa sempre que é posto em prática.
Mas, embora tenha percebido que Comunismo não funciona, a “esquerda pragmática” não abandonou seus princípios. Continua fiel à idéia de que igualdade é o ideal moral, e que a prosperidade de um custa a miséria de outro.
A “esquerda pragmática” sabe que o seu ideal não funciona, mas insiste em fazer o possível para aproximar-se dele. Busca uma mistura ideal entre liberdade e escravidão que permita alguma geração de riqueza – apenas para tomá-la de quem a criou e usá-la em seu projeto igualitário.
Por fim, a direita. No Brasil e nos Estados Unidos, os direitistas (ou “conservadores”) são defensores da liberdade econômica, acompanhada de restrições à liberdade pessoal baseadas no cristianismo.
O cristianismo prega que desde a concepção o ser humano tem alma – e sua vida é sagrada. O conservador é, portanto, contra o aborto. O fato de que a oposição se baseia em um preceito religioso é obscurecido por inúmeros argumentos falaciosos.
O cristianismo prega que a relação entre homem e mulher é sacramentada por deus. O homossexualismo, o divórcio e outros desvios em relação ao que a religião define como “certo” no relacionamento pessoal e sexual entre pessoas são freqüentemente combatidos pelos conservadores – através do poder político.
O conservadorismo, no entanto, também não é uniforme. Embora exista, principalmente nos Estados Unidos, uma direita dogmática que busca ativamente impor a moral cristã através do governo, há também uma direita “light” – religiosa em alguns poucos temas específicos (o aborto é um exemplo), mas respeitosa de muitas liberdades pessoais, embora ocasionalmente a contragosto.

“Direita” não é melhor que “esquerda”, mas o que esta direita “light” oferece hoje no Brasil e nos Estados Unidos é muito melhor do que o que querem os Comunistas e Social Democratas. A política típica “de direita” hoje não está apenas à direita, mas também acima da política de esquerda no espectro político – e isso é o que importa.

Infelizmente no Brasil esta direita que, embora não ideal, representa uma melhoria inegável sobre o esquerdismo não encontra expressão à exceção de alguns poucos intelectuais e blogueiros.
Os defensores da verdadeira liberdade, nem de direita, nem de esquerda, são ainda mais raros.
Leitura recomendada: “Nem de direita, nem de esquerda”, por Leonard Read @ OrdemLivre.org (link)
05 janeiro, 2008
Espectro político: Comunismo
À direita ficam os regimes que dão liberdade econômica, mas policiam a vida pessoal do cidadão proibindo comportamentos que não violam os direitos à vida, propriedade e liberdade de ninguém ou impondo comportamentos que o governante acha desejável. Estes regimes são tipicamente baseados em convicção religiosa, de modo que os generalizei como Teocracia.
Na zona cinzenta central ficam regimes sem princípios definidos, que violam em parte tanto as liberdades pessoais quanto as econômicas, bem como a Anarquia. Numa anarquia não há um governo para violar sistematicamente os direitos, mas também não há nada que impeça qualquer um de violá-los. Todo cidadão precisa estar continuamente alerta para se defender de todos.

Um regime que desse ao cidadão a completa liberdade pessoal – como se vestir, com quem se relacionar, quando e onde expressar sua opinião, com que princípios educar seus filhos, a opção de ter filhos – mas controlasse completamente a vida econômica de todos, este regime se situaria no canto esquerdo da figura.
Naturalmente este regime de controle puramente econômico é tão impossível quanto sua contraparte à direita. Da mesma forma como foi visto que é impossível ter plena liberdade econômica sem liberdade pessoal, aqui o mesmo se repete de forma reversa: é impossível ter plena liberdade pessoal sem liberdade econômica.
Que significa a liberdade de como se vestir se a produção e distribuição de roupas são completamente controladas pelo governo? A vida do homem é uma vida econômica – os bens materiais estão envolvidos em tudo o que fazemos, mesmo na vida pessoal.
Existem, no entanto, regimes que se aproximam desta situação. O ideal comunista é de uma sociedade em que toda a ação econômica é planejada, evitando os “problemas” e “injustiças” do Capitalismo. Quanto à vida pessoal do cidadão, com isso o comunista se preocupa pouco. Em troca da completa escravidão econômica, oferece liberdade pessoal.
É claro que na prática isto não funciona. As pessoas não se esforçam para produzir quando sabem que o resultado não será para seu próprio proveito. As pessoas não aceitam docilmente a escravidão, mesmo quando o mestre de escravos é um governo que eles mesmos colocaram no poder.
A história de todos os regimes deste gênero é de uma progressiva violação das liberdades pessoais, necessária para conseguir manter a dominação econômica. É esta a explicação para a supressão da religião, da liberdade de imprensa, da liberdade de ir e vir, da leitura de livros “ideologicamente incorretos” e todas as demais violações de liberdade pessoal que sempre acompanham o Comunismo.

Governos que dominam a vida econômica: inicialmente pode haver liberdade pessoal, mas a manutenção do controle estatal da economia requer um governo progressivamente totalitário (1)
A Venezuela de hoje é um excelente exemplo de como um regime que pretende controlar a economia progressivamente viola também as liberdades pessoais para conseguir manter-se no poder – mesmo quando originalmente eleito por desejo popular.
26 dezembro, 2007
Espectro político: Teocracia
À esquerda da figura estão os sistemas que dão liberdade pessoal e violam a liberdade econômica, à direita os que fazem o contrário. Na parte de baixo ficam regimes em que não há liberdade nem no plano pessoal nem no econômico.
A anarquia fica na zona cinzenta central. Não há governo para violar liberdades sistematicamente, por outro lado não há proteção alguma contra a violação pelo próximo. A liberdade pessoal e econômica está sujeita à interferência de todos com que se convive.
Um regime que permitisse a total liberdade econômica, ou seja, garantisse o direito de propriedade e não interferisse na produção e troca de riqueza, mas limitasse completamente a liberdade pessoal ficaria no canto direito.
Naturalmente esta situação extrema é impossível na prática. A vida do homem é uma vida econômica. Proibir a pornografia (de adultos, que fique claro), por exemplo, é uma limitação da liberdade pessoal, mas também implica o impedimento de uma série de atividades econômicas.
Há, no entanto, regimes que se aproximam desta situação. A teocracia islâmica é um bom exemplo. O islã é muito liberal em relação à produção e especialmente ao comércio. O direito à propriedade também é firmemente protegido, a pena para o roubo é perder uma mão.
Por outro lado, o Islã viola grosseiramente a liberdade pessoal. De seu comportamento sexual até o que comer e beber, o islã dita o que se pode ou não fazer. Mudar de religião é punível com a morte.
O homem que vive sob uma teocracia islâmica está muito próximo do canto direito da figura. Tem muita liberdade econômica e pouca liberdade pessoal. Já para uma mulher é diferente.
No islã a mulher é tratada praticamente como propriedade do homem, de seu pai ou marido. Daquela liberdade econômica que o homem tem ela não compartilha, muitas atividades são vedadas às mulheres, como dirigir automóveis.
Além de não possuir a mesma liberdade econômica do homem, a mulher tem ainda menos liberdade pessoal. De como se vestir até com quem, quando e o que pode falar ou quando e com quem casar, a vida da mulher é ditada pela lei islâmica e pela vontade dos homens. Uma mulher não pode sair de casa sem ser acompanhada por um homem da família.

Para uma mulher, portanto, a teocracia islâmica é um regime que está abaixo do que o mesmo regime representa para um homem, por lhe dar menos liberdade econômica. Está ainda mais abaixo por dar-lhe ainda menos liberdade pessoal.
A teocracia cristã é um contraste interessante. Antes da reforma do cristianismo, quando a igreja e o estado se confundiam nos países europeus, existia algo muito diferente do que se observa no islamismo.
Até a história recente, com a reforma e a separação entre estado e igreja, o cristianismo nunca teve uma postura liberal quanto à atividade econômica. Um dos princípios do cristianismo é a condenação da riqueza. O próprio Jesus Cristo teria dito que é mais fácil passar um camelo no furo de uma agulha que entrar um rico no paraíso.
Ao legitimar o sistema feudal, em que o servo não tinha real direito de propriedade algum, a igreja cristã estabelecia um sistema que não assegurava quase nenhuma liberdade econômica ao indivíduo desta classe.
O servo era preso à terra, não podia ir trabalhar em outro lugar. Ele não era dono do resultado de seu trabalho, tinha de trabalhar pelo senhor feudal em troca do simples direito de existir.
O senhor feudal tinha mais liberdade econômica. Podia escolher a que dedicar suas terras, podia usar sua riqueza para promover a atividade econômica que quisesse e podia gastar sua riqueza com alguns luxos. Por outro lado, estava sempre sujeito à condenação moral por sua riqueza, e precisava dar à igreja parte de sua riqueza como tributo.
Tanto senhores quanto servos estavam sujeitos às imposições da igreja quanto a seu comportamento pessoal. Das questões sexuais até a obrigação de participar de cultos ou ritos, a igreja cristã impunha muitos limites à liberdade pessoal.
Mas no plano pessoal a situação era até certo ponto o contrário da econômica. Por uma simples questão de quantidade, bem como a insignificância dos servos enquanto indivíduos, a igreja estava muito mais preocupada com o comportamento dos senhores que com o dos servos. O servo provavelmente tinha mais liberdade pessoal que o senhor, embora ambos fossem oprimidos.

Esta comparação explica, em um nível muito abstrato, o que ocorreu durante a Idade Média. Enquanto no ocidente o sistema feudal mantinha a imensa maioria da população em estado servil, no mundo islâmico havia relativa liberdade econômica, a despeito da opressão das mulheres e da violação generalizada das liberdades pessoais.
Islã e cristianismo medieval: a esmagadora maioria da população cristã tinha (5) muito menos liberdade econômica que os homens no mundo islâmico
É por isso que no ocidente houve estagnação e até regresso econômico e científico neste período, enquanto a civilização islâmica guardou o legado dos Gregos e Romanos, e protagonizou avanços em diversos campos do conhecimento (matemática, astronomia e outros). Isto não quer dizer que o regime teocrático islâmico é bom, apenas que economicamente era melhor que o cristianismo medieval.
Após as reformas, as diversas vertentes do cristianismo se tornaram mais liberais tanto no plano pessoal quanto no econômico. Mais importante, no entanto, a igreja deixou de exercer poder político. Não existem teocracias cristãs no mundo atual, embora muitos governos sejam fortemente influenciados pela ética cristã.
A reforma do cristianismo e a separação (na prática, se nem sempre de direito) entre estado e igreja foi o que permitiu à humanidade finalmente começar a migrar para a metade de cima do espectro político.
21 dezembro, 2007
Espectro político: Capitalismo e anarquia
Como visto em "Espectro político", a parte inferior da figura representa a condição em que o indivíduo não possui liberdade de ação nem no campo individual nem no campo pessoal. A parte esquerda representa liberdade pessoal com opressão econômica, a parte direita o contrário. O topo do espectro é a liberdade pessoal e econômica.
Liberdade não é algo que se pode medir com números. Com exceção dos extremos, que são definidos pela absoluta liberdade ou total falta dela, o posicionamento no espectro político é relativo. Pode-se comparar regimes políticos objetivamente, mas não numericamente.
A primeira questão a abordar é a colocação do Capitalismo como ponto mais alto do espectro. É preciso ficar claro que Capitalismo não é um sistema econômico, é a conseqüência econômica de um sistema político.
O sistema político que leva à existência de Capitalismo é o dos direitos individuais. Ao garantir a todos os indivíduos os direitos à vida, propriedade e liberdade, naturalmente estes interagirão apenas voluntariamente.
No plano econômico, isto significa uma economia baseada na troca voluntária. Como a causa política e a conseqüência econômica são inseparáveis, pode-se chamar o sistema político de Capitalismo.
A situação do cidadão que tem assegurados seus três direitos individuais é a de liberdade absoluta. É literalmente impossível ser mais livre que isto do ponto de vista político. Livre de ameaças contra sua vida e sua propriedade, e livre para tomar suas decisões, o indivíduo está completamente livre.
Duas linhas de pensamento contestam esta verdade. O pensamento de esquerda argumenta que sem garantias de sobrevivência (comida, abrigo, saúde, educação...) o indivíduo não é realmente livre. Este argumento conflita a liberdade política com o fato de que o homem precisa produzir para viver.
Sem comida, abrigo e tudo mais a vida do indivíduo certamente está em risco. Mas esta não é uma ameaça política – não é uma pessoa que está criando aquele risco, é a própria realidade. É parte da natureza humana precisar de bens materiais para viver e é um fato da realidade que estas coisas precisam ser produzidas.
A outra contestação vem do anarquismo. Não seria ainda mais livre um indivíduo que pudesse fazer qualquer coisa que quisesse? O governo que o impede de matar e roubar não está diminuindo sua liberdade? Não seria a anarquia o verdadeiro ponto máximo do espectro de liberdade?
Não. O pensamento anarquista contém uma contradição interna. Ao mesmo tempo o anarquista quer poder fazer qualquer coisa (inclusive violar os direitos dos outros) e espera que o mesmo não se reflita contra si. Querem a liberdade de tirar a liberdade alheia.
Se o anarquista tem a “liberdade” de matar e roubar, os outros também têm a “liberdade” de matá-lo e roubá-lo. Em que situação se está mais livre – quando não se pode matar e roubar e não existe nenhuma ameaça contra sua própria vida ou na anarquia em que se pode fazer qualquer coisa, mas qualquer coisa pode ser feita contra você?
Se liberdade é a ausência de ameaças contra sua vida e propriedade, a resposta é evidente. No Capitalismo ninguém pode ameaçar seus direitos. Na anarquia todos podem ameaçá-lo o tempo todo – e você precisa se defender continuamente, fisicamente.
A anarquia se encontra na zona cinzenta central. Trata-se de uma situação em que as ameaças contra a liberdade política e econômica não são baseadas em uma tese política nem são feitas pelo governo. Na anarquia a liberdade pessoal e econômica é ameaçada continuamente por todas as pessoas em volta.

Seu vizinho que não gosta de música alta poderia te dar um tiro. O carro que você estacionou na rua pode ser levado. Anarquia é isso, cada um tem a sua regra, o que significa que não há regra nenhuma. A “liberdade” de violar o direito alheio vem à custa da liberdade real.
O anarquista argumenta que as pessoas se organizarão voluntariamente para defenderem seus direitos. Ora, isto significa que formarão um governo – e está acabada a anarquia. Um governo formado e financiado voluntariamente para defender os direitos individuais é um governo Capitalista.
O Capitalismo, portanto, é realmente o ponto mais alto do espectro político. É impossível ser mais livre.
20 dezembro, 2007
Espectro Político
É comum associar as diversas vertentes políticas a padrões de referência. O padrão mais simples e mais usual é o que estabelece o espectro político entre a “esquerda” e a “direita”. Ser Capitalista, ou seja, defender os direitos individuais, significa ser “de direita”?
O problema com a representação do espectro político entre “esquerda” e “direita” é que estes termos não são capazes de representar todos os aspectos da política. O mesmo vale para “liberal” e “conservador”, agravado pelo fato que o significado destes últimos termos tem mudado muito com o tempo.
Ser “de esquerda” significa, popularmente, defender o pobre contra o rico. Significa ser a favor de políticas governamentais de transferência de riqueza e ver como obrigação do governo a provisão de “serviços essenciais” e infra-estrutura.
Quem é “de esquerda” também costuma ser a favor de certas liberdades pessoais, defendendo políticas como a permissão do casamento entre homossexuais, legalização de drogas e do aborto.
Ser “de direita” significa, popularmente, defender os interesses dos ricos. Significa ser contra impostos e transferência de riqueza, e ser defensor de um governo mínimo – embora em muitos casos ainda mantendo a idéia que serviços essenciais e infra-estrutura são responsabilidade governamental.
Quem é “de direita” também costuma associar sua posição política ao cristianismo, sendo a religião a base e justificativa para suas convicções éticas e políticas. Desta forma, tende a ser contra o aborto, contra o casamento entre homossexuais e contra a legalização das drogas.
Como se pode ver, cada um é a favor de certas liberdades e contra outras – o espectro entre “esquerda” e “direita” está entre misturas diferentes de liberdade e coerção.
David Nolan, fundador do Partido Libertário nos Estados Unidos identificou este fato e propôs um espectro político com dois eixos. Como libertário, certamente ele percebeu que em alguns assuntos concordava com os “liberais” e em outros com os “conservadores”. Os assuntos de um caso e de outro formam categorias claramente identificáveis.
No gráfico de Nolan, do qual a figura abaixo é uma adaptação, as dimensões refletem a liberdade econômica e a liberdade pessoal.

Tipicamente o “liberal” ou “de esquerda” advoga a liberdade de comportamento pessoal, mas é a favor de políticas que violam a liberdade econômica. Em contrapartida, o conservador tipicamente é a favor da liberdade econômica, mas usa o governo para impor um padrão de comportamento.
Os libertários são um grupo heterogêneo que como linha geral defende a liberdade pessoal e a econômica. Anarquistas, “anarco-socialistas”, “anarco-capitalistas” e adeptos do governo mínimo todos se enquadram no guarda-chuva amplo do libertarismo, embora muitos tenham convicções mutuamente incompatíveis.
O Capitalismo, entendido como o governo baseado na defesa dos direitos à vida, propriedade e liberdade também se encontra neste quadrante – mas ao contrário do vago libertarismo, possui uma teoria política muito clara e objetiva.

Quando o indivíduo não tem liberdade pessoal nem econômica se está no canto inferior da figura. Isto é o que ocorre sob um governo totalitário, em que todas as ações do cidadão estão sujeitas à vontade do governo.
Quando há liberdade econômica mas nenhuma liberdade pessoal, se está no canto direito da figura. Uma situação muito próxima a esta ocorre em certas Teocracias islâmicas. O Islã é muito liberal economicamente - mas policia cada detalhe do comportamento pessoal.
Quando há liberdade pessoal mas nenhuma liberdade econômica, se está no canto esquerdo da figura. Este é o ideal Comunista. Pouco importa ao comunista as escolhas que o indivíduo faz na vida pessoal - mas toda a ação econômica precisa ser determinada pelo governo.
O Capitalismo é o ápice da figura, é a condição em que todos os indivíduos têm absoluta liberdade pessoal e econômica, pois seus direitos individuais estão garantidos. Podem fazer tudo o que querem no campo pessoal e no econômico – limitados apenas pelo respeito à vida, propriedade e liberdade dos demais.