23 agosto, 2007

O direito à liberdade

Dos três direitos identificados através da ética racional já escrevi sobre o Direito à Vida e sobre o Direito à Propriedade. Resta falar sobre o Direito à Liberdade. Deixei a liberdade por último não por ser menos importante que o direito à propriedade ou à vida, mas porque é principalmente através de ameaças à vida e à propriedade que o direito à liberdade é violado.

Os três direitos são completamente interdependentes. É evidente a impossibilidade de ter liberdade ou propriedade estando morto. A dependência destes dois direitos em relação ao direito à vida é óbvia.

Menos óbvio é o fato de que é impossível viver ou ser livre sem propriedade. Se o indivíduo não tem o direito de usar aquilo que produz como bem entende, necessariamente existe alguém o impedindo de fazê-lo. Isto significa que este indivíduo não está livre para agir de acordo com sua razão, está sendo obrigado a seguir as decisões de outro. Não há liberdade sem o direito à propriedade.

Se lembrarmos que o parâmetro para a vida não é a mera sobrevivência do corpo, mas sim a vida de um ser racional e independente, a correlação entre propriedade e vida também fica clara. Sem o direito de usar tudo aquilo que produz, o indivíduo não depende apenas de seu trabalho para existir – mas também da permissão alheia. Removida sua independência, ele não está mais vivendo a vida de um ser racional e independente – mesmo que sobreviva.

Também é impossível viver ou ter propriedade sem ter liberdade. Se o indivíduo não pode agir livremente, evidentemente não pode usar aquilo que produz livremente. Sem liberdade não pode haver propriedade. Invocando novamente a vida de um ser racional e independente como parâmetro, também fica claro que sem poder agir de acordo com suas decisões é impossível a vida como ser racional – embora a sobrevivência física seja possível.

O direito à vida e o direito à propriedade podem ser violados diretamente, usando a força física para tomar a vida ou remover a propriedade do indivíduo. Quando vida ou propriedade é ameaçada, é violado também o direito à liberdade.

Pode-se fisicamente prender uma pessoa, fechando-a em uma cela, amarrando-a ou acorrentando-a. A violação direta do direito à liberdade é clara e evidente. Sua violação indireta é muito mais comum, mas também se dá através do uso da força. Ao apontar uma arma para sua vítima, a vida dela passa a ser condicionada à obediência ao assaltante. Foi removida a possibilidade de escolher livremente como agir. A escolha da vítima é limitada a obedecer ou morrer.

A coação, a violação indireta do direito à liberdade, se dá desta forma. Tornando algo que pertence à vítima por direito (sua vida ou sua propriedade) e tornando este valor condicional à obediência. Claramente é apenas através da ameaça do uso da força que se pode violar o direito à liberdade, pois é impossível ameaçar o que o indivíduo tem se não pelo uso da força.

Apenas se viola o direito à liberdade quando se ameaça algo que a pessoa tem. Este entendimento permite eliminar uma interpretação errada do direito à liberdade que cria a ilusão de conflitos entre os direitos das pessoas. O erro é tratar a “ameaça” contra algo que a pessoa ainda não tem como violação de seus direitos.

Este erro é muito freqüente ao discutir relações profissionais. É extremamente comum o seguinte argumento: “O empregado é pobre e desqualificado, o empregador oferece um salário baixo demais, injusto, mas o empregado é obrigado a aceitar”.

Antes de ser contratado, o que o pobre e desqualificado trabalhador tem? Tem sua vida e seus poucos bens. O empregador ameaça tirar a vida ou os poucos bens do trabalhador ao oferecer-lhe emprego? Não. Aliás, pelo contrário, oferece a oportunidade de acrescentar um pouco a estes bens.

“Mas sem o emprego o trabalhador pobre morreria de fome, sua vida está ameaçada” retrucam. Mas não é o empregador que “ameaça” o indivíduo, mas a própria natureza – que exige que ele se alimente, entre outras coisas. Não é culpa do empregador que o futuro empregado precisa comer, seja qual for o salário que oferecer.

Se o empregado realmente foi “obrigado” a aceitar, isto apenas significa que a oferta daquele empregador foi a melhor opção que existia (não fosse, teria escolhido outra). O empregador, longe de ameaçar o pobre trabalhador ou violar seus direitos como bradam os Marxistas, ofereceu-lhe nada menos do que a melhor saída para sua situação anterior. Pode não ser boa a condição do empregado, mas com certeza é melhor do que a que tinha antes!

Culpar pessoas pelas “obrigações” impostas pela natureza é um dos erros mais freqüentes no entendimento do direito à liberdade.

Outra forma desta deturpação do direito à liberdade é comum ao discutir a liberdade de expressão. Em defesa da “democratização da mídia” muitos reclamam que quem é pobre ou tem opiniões impopulares tem sua liberdade de expressão violada – porque não consegue espaço na mídia.

O que o “sem voz” tem? Tem sua vida, sua propriedade e suas opiniões. Alguém está ameaçando sua vida ou propriedade? Não. Alguém está fisicamente o impedindo de expressar suas opiniões? Não. Ao recusar ajuda ao pobre ou impopular, estas pessoas não estão violando nenhum de seus direitos – apenas estão recusando dar àquela pessoa algo a mais, não estão tirando ou ameaçando algo que ela já tem.

O indivíduo tem o direito de falar e de escrever, mas ninguém tem a obrigação de ouvi-lo ou comprar papel e caneta para que ele escreva. Ninguém tem a obrigação de transmitir suas opiniões por rádio ou televisão. “A mídia” são outras pessoas, e a propriedade de outras pessoas. Pessoas que têm a liberdade de não ajudar.

Em geral a solução proposta para o "problema" é que “o governo deve criar mecanismos estatais, para que estas pessoas possam ser ouvidas!”. Aí está o governo Lula criando uma televisão estatal, em tese para “democratizar a mídia”. Mas de onde vem o dinheiro do governo? É tirado da população pelos impostos. Ou seja, as mesmas pessoas que não querem pagar para ouvir os “sem voz” (pois se quisessem, “a mídia” os publicaria) são forçadas pelo governo a fazê-lo!

Neste, como em todos os casos, não há violação de direitos até que se use a força. Os verdadeiros direitos são apenas garantia contra a interferência dos outros. Ninguém é obrigado a dar ao outro um prato de comida, nem um palanque para ser ouvido.

O verdadeiro direito à liberdade não garante imunidade das leis físicas da natureza. O direito à liberdade também não garante que o indivíduo será capaz de fazer o que quer, nem muito menos que outros cooperarão com ele. Garante apenas que outros não ameaçarão sua vida ou propriedade, nem o impedirão fisicamente de agir como quiser – desde que não viole os direitos deles.