À esquerda da figura estão os sistemas que dão liberdade pessoal e violam a liberdade econômica, à direita os que fazem o contrário. Na parte de baixo ficam regimes em que não há liberdade nem no plano pessoal nem no econômico.
A anarquia fica na zona cinzenta central. Não há governo para violar liberdades sistematicamente, por outro lado não há proteção alguma contra a violação pelo próximo. A liberdade pessoal e econômica está sujeita à interferência de todos com que se convive.
Um regime que permitisse a total liberdade econômica, ou seja, garantisse o direito de propriedade e não interferisse na produção e troca de riqueza, mas limitasse completamente a liberdade pessoal ficaria no canto direito.
Naturalmente esta situação extrema é impossível na prática. A vida do homem é uma vida econômica. Proibir a pornografia (de adultos, que fique claro), por exemplo, é uma limitação da liberdade pessoal, mas também implica o impedimento de uma série de atividades econômicas.
Há, no entanto, regimes que se aproximam desta situação. A teocracia islâmica é um bom exemplo. O islã é muito liberal em relação à produção e especialmente ao comércio. O direito à propriedade também é firmemente protegido, a pena para o roubo é perder uma mão.
Por outro lado, o Islã viola grosseiramente a liberdade pessoal. De seu comportamento sexual até o que comer e beber, o islã dita o que se pode ou não fazer. Mudar de religião é punível com a morte.
O homem que vive sob uma teocracia islâmica está muito próximo do canto direito da figura. Tem muita liberdade econômica e pouca liberdade pessoal. Já para uma mulher é diferente.
No islã a mulher é tratada praticamente como propriedade do homem, de seu pai ou marido. Daquela liberdade econômica que o homem tem ela não compartilha, muitas atividades são vedadas às mulheres, como dirigir automóveis.
Além de não possuir a mesma liberdade econômica do homem, a mulher tem ainda menos liberdade pessoal. De como se vestir até com quem, quando e o que pode falar ou quando e com quem casar, a vida da mulher é ditada pela lei islâmica e pela vontade dos homens. Uma mulher não pode sair de casa sem ser acompanhada por um homem da família.
Para uma mulher, portanto, a teocracia islâmica é um regime que está abaixo do que o mesmo regime representa para um homem, por lhe dar menos liberdade econômica. Está ainda mais abaixo por dar-lhe ainda menos liberdade pessoal.
A teocracia cristã é um contraste interessante. Antes da reforma do cristianismo, quando a igreja e o estado se confundiam nos países europeus, existia algo muito diferente do que se observa no islamismo.
Até a história recente, com a reforma e a separação entre estado e igreja, o cristianismo nunca teve uma postura liberal quanto à atividade econômica. Um dos princípios do cristianismo é a condenação da riqueza. O próprio Jesus Cristo teria dito que é mais fácil passar um camelo no furo de uma agulha que entrar um rico no paraíso.
Ao legitimar o sistema feudal, em que o servo não tinha real direito de propriedade algum, a igreja cristã estabelecia um sistema que não assegurava quase nenhuma liberdade econômica ao indivíduo desta classe.
O servo era preso à terra, não podia ir trabalhar em outro lugar. Ele não era dono do resultado de seu trabalho, tinha de trabalhar pelo senhor feudal em troca do simples direito de existir.
O senhor feudal tinha mais liberdade econômica. Podia escolher a que dedicar suas terras, podia usar sua riqueza para promover a atividade econômica que quisesse e podia gastar sua riqueza com alguns luxos. Por outro lado, estava sempre sujeito à condenação moral por sua riqueza, e precisava dar à igreja parte de sua riqueza como tributo.
Tanto senhores quanto servos estavam sujeitos às imposições da igreja quanto a seu comportamento pessoal. Das questões sexuais até a obrigação de participar de cultos ou ritos, a igreja cristã impunha muitos limites à liberdade pessoal.
Mas no plano pessoal a situação era até certo ponto o contrário da econômica. Por uma simples questão de quantidade, bem como a insignificância dos servos enquanto indivíduos, a igreja estava muito mais preocupada com o comportamento dos senhores que com o dos servos. O servo provavelmente tinha mais liberdade pessoal que o senhor, embora ambos fossem oprimidos.
Esta comparação explica, em um nível muito abstrato, o que ocorreu durante a Idade Média. Enquanto no ocidente o sistema feudal mantinha a imensa maioria da população em estado servil, no mundo islâmico havia relativa liberdade econômica, a despeito da opressão das mulheres e da violação generalizada das liberdades pessoais.
Islã e cristianismo medieval: a esmagadora maioria da população cristã tinha (5) muito menos liberdade econômica que os homens no mundo islâmico
É por isso que no ocidente houve estagnação e até regresso econômico e científico neste período, enquanto a civilização islâmica guardou o legado dos Gregos e Romanos, e protagonizou avanços em diversos campos do conhecimento (matemática, astronomia e outros). Isto não quer dizer que o regime teocrático islâmico é bom, apenas que economicamente era melhor que o cristianismo medieval.
Após as reformas, as diversas vertentes do cristianismo se tornaram mais liberais tanto no plano pessoal quanto no econômico. Mais importante, no entanto, a igreja deixou de exercer poder político. Não existem teocracias cristãs no mundo atual, embora muitos governos sejam fortemente influenciados pela ética cristã.
A reforma do cristianismo e a separação (na prática, se nem sempre de direito) entre estado e igreja foi o que permitiu à humanidade finalmente começar a migrar para a metade de cima do espectro político.