22 fevereiro, 2008

Espectro político: Estados Unidos

Um contraste que deixa mais claro o fato de que no Brasil só existe esquerda é o espectro político dos Estados Unidos. As prévias para a eleição presidencial americana em novembro estão sendo intensamente noticiadas e comentadas na nossa imprensa, o que tem provocado o interesse de muitos pelo processo eleitoral e pelas forças políticas que existem lá.

Nos EUA há dois partidos majoritários, o partido Democrata e o partido Republicano. Não é proibido criar outros partidos e, diferente daqui, nem é preciso pertencer a um partido para se candidatar. Pode-se concorrer como “independente” – e nas esferas locais às vezes os “independentes” são eleitos.

O partido Democrata é um partido de esquerda. A plataforma do partido consiste em aumentar os programas governamentais de assistência (previdência, saúde, educação etc), além de expandir a interferência estatal na vida econômica. O partido Democrata americano é o partido que defende a regulamentação, as barreiras comerciais e a taxação das empresas como caminho para a prosperidade.

Socialmente o partido Democrata historicamente é defensor das liberdades civis como a união civil de homossexuais e do direito ao aborto (que existe nos EUA). A base de sustentação do partido Democrata são os sindicatos (especialmente os sindicatos de funcionários públicos), os ativistas das “minorias” e seus simpatizantes.

O partido Republicano é um partido de direita, conservador. A plataforma histórica do partido é a preservação do sistema econômico americano tradicional: a liberdade econômica. Os Republicanos são tradicionalmente defensores da diminuição da interferência do governo na vida econômica, sendo contra barreiras comerciais e a favor da limitação dos programas assistenciais. A redução de impostos é uma bandeira tradicional do partido.

Socialmente o partido Republicano defende a moral cristã, e tem na Igreja seu principal pilar de sustentação. Os Republicanos costumam se posicionar contra a união civil de homossexuais, contra o direito ao aborto e contra a pesquisa científica com embriões humanos, por exemplo.

Para compreender o cenário americano, é preciso relacionar o posicionamento destes partidos em relação às forças políticas que conhecemos no Brasil. Esta comparação pode ser feita identificando princípios e posições defendidos por Democratas e Republicanos e comparando com o que se tem aqui.

Em primeiro lugar, vamos posicionar a esquerda americana. O partido Democrata é sustentado por sindicatos, principalmente os do funcionalismo público. No Brasil o PT e seus aliados detém este posicionamento.

Nos EUA a filiação a um sindicato é opção de cada um, enquanto no Brasil é obrigatória. Nos EUA qualquer grupo pode criar um sindicato, inclusive vários para a mesma área. No Brasil só pode haver um para cada atividade, e o governo escolhe qual é o “legítimo”. Obrigar o cidadão a ser representado por um sindicato e proibir que as pessoas se unam livremente em sindicatos diversos seria considerado uma interferência ilegítima na vida do cidadão – mesmo por um Democrata.

O partido Democrata americano é a favor da interferência do governo na economia. No Brasil, todos os partidos são – em maior ou menor grau. O modelo dos Democratas americanos, no entanto, é o da regulamentação e taxação e não do controle direto. Defendem que o governo deve determinar o que e como se pode produzir, bem como controlar preços e garantir que não há “abusos”, mas num contexto de iniciativa privada.

O partido Democrata americano defende um regime econômico que preserva a iniciativa privada – apenas dá ao governo a prerrogativa de colocar sela e cabresto nesta iniciativa e virá-la na direção que acha melhor (em vez de deixar as pessoas fazerem o que elas acham melhor). Esta postura é similar ao ideal defendido por nossa esquerda “light”, PSDB, DEM e seus aliados.

O partido Democrata, portanto, se situa próximo aos nossos PSDB e DEM no espectro político. Embora represente a extrema esquerda americana, o princípio da liberdade individual (sobre o qual os EUA foram fundados) ainda permeia o partido Democrata.

É curioso que partidos chamados “Democratas” no Brasil e nos EUA estejam na mesma região do espectro político, embora representem nossa extrema “direita” e a extrema esquerda deles.

O partido Republicano não tem equivalente na política brasileira. Seus princípios econômicos – que cada um é responsável por sua própria prosperidade e que ao governo cabe apenas estabelecer as regras do jogo (sem tentar definir quem ganha) – não encontram par no Brasil. Aqui todos os partidos estão engajados em ajudar alguém às custas de outro.

Na política social também não temos algo parecido com o conservadorismo americano. Para se tomar referência, um dos pré-candidatos Republicanos afirmou que era necessário reescrever a Constituição dos EUA para adequá-la à Bíblia. Embora a Igreja Católica seja muito influente no Brasil, ela não determina a posição de partidos brasileiros como ocorre com o partido Republicano.

Isto provavelmente ocorre por dois grandes motivos. Em primeiro lugar, no Brasil já não existe direito ao aborto (certamente a questão mais controversa nos EUA). Caso houvesse, é provável que a questão se tornasse uma bandeira política e trouxesse a religião para dentro do debate.

Em segundo lugar, por aqui a Igreja é aliada de partidos de extrema esquerda, que têm uma tradição de políticas sociais liberais. No Brasil a Igreja parece ter decidido que é mais importante forçar o indivíduo a fazer caridade (usando o governo para tirar seu dinheiro à força e dar a outro) do que defender suas posições sociais.

O partido Republicano, portanto, representa uma defesa da liberdade econômica sem comparação no Brasil, bem como uma mistura de preceitos religiosos na política que também não tem par nos partidos brasileiros majoritários.

Como visto em “Nem direita, nem esquerda” não devemos invejar o conservadorismo americano por ser de direita. A interferência do estado na vida social não é boa – seja inspirada pela religião ou não. O invejável é que existe uma força política que defende o que é certo na vida econômica: o Capitalismo.

Tomando a metade boa do partido Democrata americano (sua política social) e a metade boa do partido Republicano (sua política econômica), tem se os elementos do que é a política correta para a vida em sociedade: a liberdade individual. São estas boas influências que mantém os EUA avançando a passos largos – e a ausência da “parte boa” na política econômica do Brasil que nos mantém eternamente atrasados.