05 março, 2008

Governo legítimo: A guerra

O caso do polêmico ataque colombiano a uma base das FARC em território equatoriano é uma oportunidade de se discutir a política internacional de um governo legítimo.

O que legitima um governo é a defesa dos direitos individuais à vida, liberdade e propriedade de seus cidadãos. Governos, por sua natureza, têm esta função. Quando a cumprem, são legítimos. Quando não a cumprem acabam por violar os direitos que deveriam proteger, tornando-se os piores inimigos de seus cidadãos.

A política externa de um governo legítimo deve, portanto, ter um único objetivo: garantir a defesa da vida, liberdade e propriedade de seus cidadãos. Outros objetivos que concorram com este são necessariamente ilegítimos.

As ações de um governo no campo internacional devem ser julgadas por este critério. As que levam à maior segurança dos cidadãos são legítimas, as que não o fazem são ilegítimas. Ademais, como direitos individuais decorrem da natureza humana e não da nacionalidade, ações que violam os direitos individuais de estrangeiros são, necessariamente, ilegítimas.

Embora possa parecer que estes princípios sejam conflitantes, na verdade são consistentes. Nunca é necessário violar os direitos individuais de uns para proteger os de outros. Isto vale tanto na política interna quanto na externa. O que desfaz o aparente paradoxo é o fato de que criminosos, ao optarem pelo crime, abrem mão de seus direitos por demonstrarem que não os respeitam nos outros.

Um indivíduo que opta pelo crime afirma que não reconhece os direitos individuais. Assim sendo, é legítimo ao estado usar contra ele a força em defesa dos inocentes que ele vitimou. Não é uma violação de direitos humanos prender um assassino, porque ao matar ele demonstra não reconhecer direito algum, no mesmo ato abre mão dos seus próprios. Direitos individuais são características de seres racionais. Ao optar por viver como um animal, pela força, o criminoso deve ser tratado como tal.

No caso da legitimidade de governos, vale o raciocínio análogo. Um governo legítimo defende os direitos individuais. Ao fazê-lo legitima suas leis, instituições e território. A soberania nacional não é intrínseca, é o reconhecimento da legitimidade de um governo por outro.

Na disputa com as FARC, o governo colombiano age para proteger seus cidadãos contra assassinato, seqüestro e, presumivelmente, contra a implantação de um regime comunista (se levarmos a sério o “R”, de “revolucionárias”). Em todos os aspectos, portanto, defende os direitos individuais dos cidadãos colombianos. É isso, e não o fato de ser um governo eleito pelo voto, que legitima a ação do governo Álvaro Uribe contra as FARC.

O governo do Equador, por sua vez, não tem em princípio a função de defender cidadãos colombianos. Sua função deveria se proteger os direitos do cidadão equatoriano. Mas quando uma organização que sistematicamente comete crimes se instala em seu território, aplica-se o conceito acima: direito individual não depende de nacionalidade.

Quando o governo da Colômbia informou o governo do Equador que as FARC estavam instaladas em seu território, havia dois caminhos legítimos para os equatorianos: agirem eles mesmos contra a organização criminosa ou darem permissão para que a Colômbia o fizesse.

O governo do Equador optou, no entanto, por negar que havia a tal infiltração. Hoje, com os dados apreendidos na ação colombiana contra a base das FARC, sabemos que os equatorianos não só sabiam da presença das FARC em seu território como negociavam meios de melhor acomodá-los. Removendo da região militares equatorianos não simpatizantes, por exemplo.

Ao se negar a confrontar criminosos em seu território, mesmo quando os crimes eram cometidos fora dele, o governo do Equador perdeu sua legitimidade. A ação do governo da Colômbia foi legítima, por visar a proteção dos direitos do cidadão colombiano, e não violou a soberania de um governo legítimo. Seria diferente se o ataque fosse no território de uma nação empenhada em combater o terror, ou se tivesse sido tomada sem dar ao Equador a chance de resolver o problema por si.

A verdade crua é que tanto o Equador de Rafael Correa quanto a Venezuela de Hugo Chavez são aliados das FARC, ativamente apoiando a violação dos direitos de cidadãos colombianos. Este sim é o “ato de guerra”, as ações da Colômbia são em defesa própria.

Uma situação muito similar ocorre com Israel. Um governo que defende os direitos individuais de seus cidadãos (e dos estrangeiros inocentes em seu território) cercado por tiranias que abusam de seu próprio povo e desejam abusar também dos israelenses. Abrigam e apóiam terroristas que atacam Israel, e ficam indignados quando Israel se defende.

A postura internacional correta, de um governo legítimo, é reconhecer e apoiar outros governos legítimos – aqueles que defendem os direitos individuais de seus cidadãos. Isto é uma ação em defesa de seus próprios cidadãos, pois unidos os governos legítimos têm mais capacidade de se defender mutuamente de agressores.

Em relação a governos estrangeiros ilegítimos, não é obrigação do governo legítimo “libertar” os povos oprimidos nem “levar a democracia” a eles – mas com certeza é seu direito fazê-lo quando isto for favorável à defesa de seus próprios cidadãos.

Quando um destes governos estrangeiros se torna uma ameaça, aí é obrigação do governo defender seus cidadãos contra ele, militarmente quando necessário. Toda guerra legítima é uma guerra de defesa, mas não é preciso esperar ser atacado para se defender – a ameaça concreta é suficiente.

Da mesma forma que indivíduos delinquentes tentam usar as liberdades individuais para cometer seus crimes, da mesma forma que governantes delinquentes tentam usar a liberdade política para destruí-la, assim também nações delinquentes estão tentando usar as leis internacionais de países civilizados para destruir esta mesma civilidade.

É preciso reconhecer o direito das nações livres de defender seus cidadãos, direito este que não está subordinado à aprovação de nenhum outro país. Aqueles que se colocarem em seu caminho, devem estar preparados para lidar com as consequências.