Está ganhando força no meio político e na mídia o furacão em torno da possibilidade de Lula se candidatar a um terceiro mandato. Para que isto seja possível, sem quebra da legalidade, seria necessária uma alteração na Constituição.
Enquanto Lula nega a intenção de se re-candidatar novamente, no Congresso Federal deputados do PT e da base aliada já começam articulações em favor de uma emenda constitucional que o permita.
É apenas mais uma instância do modo de operar do PT, e do governo que não se distingue do partido. Os “desconhecidos” dão andamento àquilo que realmente interessa, enquanto os figurões vão levando o dia-a-dia como se nada estivesse acontecendo.
Quando a trama dá certo, em geral nem ficamos sabendo. Quando dá errado, ficamos conhecendo os “aloprados” e seus nomes estranhos, enquanto os figurões com a cara lavada dizem que não sabiam de nada. Em troca, os figurões garantem a impunidade de seus companheiros.
O colunista Reinaldo Azevedo foi um dos primeiros a profetizar que haveria este impulso pela manutenção de Lula no poder. Previu inclusive a forma como ocorreria o fenômeno – não uma intenção política clara de Lula, mas um “movimento popular” em favor de sua permanência. Restaria a Lula, magnânimo, dizer que “se é para o bem geral da nação, diga ao povo que fico”.
Como Reinaldo, as forças políticas de oposição real ao petismo já começam a se manifestar contra a re-reeleição. O Presidente Fernando Henrique Cardoso recentemente disse que um terceiro mandato é uma insensatez.
Vou, portanto, contra a corrente de meus poucos aliados na luta intelectual contra o petismo ao dizer que sou a favor da possibilidade de reeleição, sem limitação.
A alternância no poder é pregada como condição necessária para a existência de liberdade política (que a maioria das pessoas erroneamente chama de democracia). Mas não é a alternância de fato do governante que é necessária para que exista liberdade – e sim a possibilidade de trocar o governante e o governo.
Na Venezuela hoje não há possibilidade de demover Hugo Chavez e seu governo, pois este controla o processo eleitoral. Já durante governo militar do Brasil, houve alternância de governantes – mas a manifestação política era proibida. Ambos são exemplos de ditaduras.
Um país que reeleja um mesmo governante durante vinte anos não será uma ditadura – desde que cada reeleição seja de fato livre. Um país que troque seu líder anualmente não deixará de ser uma ditadura se não permitir a livre manifestação e a participação popular no processo político.
Defendo a liberdade de reeleição por princípio. Se o governante está disposto a continuar governando e a população deseja que assim seja, não há benefício algum em proibi-lo. Quem questiona isto se colocar na posição de dizer que sabe escolher governantes melhor que o eleitorado – e esta é a mentalidade do ditador.
Em um país livre, a Constituição garantiria a todos os cidadãos a defesa de seus direitos – à vida, propriedade e liberdade – independente do governante. Nesta situação é fácil ver que a reeleição livre não ofereceria risco a nenhum cidadão.
Argumenta-se, no entanto, que em nossa realidade a alternância é essencial. Como o estado não é defensor de direitos individuais e sim uma arma usada por um grupo para tirar proveito de outros, a alternância serviria para “equilibrar” as coisas.
Há um grande erro nesta tese: achar que eleições populares levariam a uma alternância de poder. No contexto de um estado interventor, a democracia (no sentido correto: governo da maioria) converge para a permanência no poder daqueles que prometem usar o governo para "beneficiar" a maioria às custas de uma minoria.
No Brasil isto é claro. No contexto político atual, todos os partidos prometem dar renda, escolas, hospitais, transporte e tudo o mais a “quem precisa”. Ninguém faz campanha para “quem paga a conta”. A alternância pode até mudar o partido que está no poder – mas não muda os princípios básicos que são defendidos. É uma questão de números – há muito mais votos de “quem precisa”.
A objeção à proibição da reeleição livre não é apenas teórica. Há conseqüências práticas importantes desta proibição.
As gestões de Paulo Maluf em São Paulo se tornaram notórias pela realização de obras faraônicas e consequente quebra das finanças do governo – deixando para o sucessor a conta. Muitos viam o "foi Maluf que fez", poucos percebiam que não foi no governo dele que se pagou.
Ao permitir a reeleição, o sistema político obriga o governante a pensar não apenas no prazo de um mandato, mas também no mandato seguinte. A reeleição livre o obrigaria a pensar no longo prazo – pois pode ser ele mesmo a arcar com as conseqüências de seus atos.
A grande vantagem da reeleição livre é obrigar o governante a viver com suas decisões até suas últimas conseqüências práticas e políticas.
Não é bom para o país um terceiro mandato de Lula, mas é preferível que se deixe transcorrer este processo político até suas últimas consequências, miséria e tirania, a estender o sofrimento através de paliativos periódicos que mascaram os reais efeitos do petismo.
Ademais, caso os mosqueteiros de Lula não consigam legalizar sua nova reeleição, e caso ele não esteja disposto a seguir os passos de seu amigo Hugo Chavez e faze-lo ao arrepio da lei, pode sempre seguir o caminho de seu outro amigo Nestor Kirchner e candidatar a D. Marisa Letícia à presidência...