19 outubro, 2007

Governo dá incentivo?

Já mostrei que a essência do governo é o uso da força. É o monopólio sobre o uso da força que define uma organização como governo e, dada esta natureza, a força está inevitavelmente envolvida em toda ação governamental.

É importante, portanto, expor um erro muito grave ao lidar com a ação governamental. O erro é achar que o governo é capaz de dar “incentivo”. Este erro é extremamente comum, em todas as partes do espectro ideológico.

O coletivista típico não tem ressalvas em relação a usar a força do estado contra indivíduos inocentes, defende abertamente o assalto aos “ricos” supostamente em benefício aos “pobres”. É na mente de quem pretende ser defensor da liberdade que este erro é mais grave.

Um primeiro exemplo é o artigo “Agricultura e conservação: incentivo ou punição?”, de André Meloni Nassar. O artigo aborda o tema de “zoneamento agroecológico”, um conjunto de regras para o uso da terra visando a ocupação do território nacional “em bases mais ambientalmente sustentáveis”.

A tese do artigo é que o governo pode fazê-lo de duas formas, através do uso do poder de coerção do estado ou através do incentivo. Nassar argumenta que a via da punição não funcionará, citando como exemplo o Código Florestal, que já é extremamente rígido, mas não garante a preservação ambiental pretendida.

A regulamentação proibitiva do uso da terra “não funciona”, nisto Nassar está certo. É apenas mais um exemplo de como regulamentação gera corrupção, pobreza e criminalidade. Ao proibir algo que não faz mal a ninguém (não viola direitos) e faz bem a muitos (é uma ação produtiva) o estado gera um incentivo para que a lei seja violada ao mesmo tempo em que limita a liberdade econômica do cidadão.

O erro crasso de Nassar é achar que existe a alternativa, que o estado é capaz de dar incentivo. O erro é achar que o estado, cuja natureza é usar a força, tem alternativa de ação diferente do “uso do poder de coerção”.

Da mesma forma como a regulamentação (que é sempre uma proibição) às vezes é apresentada travestida de “permissão”, às vezes o poder de ameaça física do estado é travestido de “incentivo”.

Qual a forma do “incentivo” governamental? Só há duas formas possíveis: o governo beneficia uns em prejuízo de outros, ou o governo remove restrições que ele mesmo havia criado. Não há real incentivo governamental, pois o governo não é produtivo por natureza, e sim destrutivo. O governo não gera riqueza – usa a força.

O que é um “incentivo fiscal”? É a redução da carga de impostos para uma determinada atividade ou pessoa. Isto é realmente um incentivo? É claro que não. Foi o governo que criou o problema, ao tomar de gente inocente o resultado de seu trabalho. Chamar a redução de uma injustiça de “incentivo” é perverter o sentido da palavra. Incentivo é oferecer um benefício, não remover um malefício que você mesmo criou. Se o estado parar de usar seu poder de coerção contra os outros, desaparece o “incentivo”.

O mesmo vale para qualquer “incentivo” que seja uma “permissão” especial para uma determinada atividade ou pessoa. Se algo que não viola o direito de ninguém é proibido, como derrubar toda a floresta em um terreno de sua propriedade e praticar agricultura, dar “permissão” para que isto seja feito em alguns casos não é um incentivo. É apenas a remoção de uma proibição injusta. Se o estado parar de usar seu poder de coerção contra os outros, desaparece o “incentivo”.

Finalmente, o caso é ainda mais claro quando o “incentivo” trata-se de um subsídio direto. Se o governo dá dinheiro, ou um financiamento abaixo dos níveis de mercado – o que é a mesma coisa, para uma dada atividade ou pessoa, não é um incentivo. O estado não produz riqueza. O dinheiro doado foi tirado à força de um cidadão inocente, através dos impostos. Mais uma vez, se o estado parar de usar seu poder de coerção contra os outros, desaparece o “incentivo”.

Quando o governo dá um “incentivo” a alguém, isto apenas que está o prejudicando menos do que prejudicava antes, que está o prejudicando menos do que prejudica os outros ou que está o beneficiando às custas de prejudicar os outros. Mas sempre está usando a força contra alguém.

Até pessoas das mais esclarecidas e simpáticas à liberdade individual podem ser vítimas deste erro. Reinaldo Azevedo, que usualmente escreve com propriedade sobre política e governo, também tropeçou. Em “Ampliação da licença-maternidade: por que se fez a coisa certa”, postado em seu blog (19/10/2007), diz sobre a mesma:


O que há de positivo na proposta aprovada no Senado? O fato de a adesão ser facultativa. As empresas que aderirem à medida terão compensações fiscais. É assim que se faz.


Ou seja, quem aceitar esta nova regra ganha o direito de ser menos roubado que os outros. Isto não é incentivo, é chantagem. O certo seria abolir a lei que obriga o empregador a pagar pelas escolhas pessoais de suas funcionárias, permitindo que cada um arcasse com os custos de suas próprias decisões. O certo seria que o governo parasse de roubar todas as pessoas inocentes através de impostos.

É assim que se faz a verdadeira liberdade.