21 março, 2007

O princípio da Honestidade

Nos artigos anteriores foram abordados os princípios éticos da Racionalidade e Independência. Já foi estabelecido que a natureza do homem exige o uso contínuo da razão para determinar como se deve agir, e que este julgamento é inescapavelmente individual.

O ser humano existe imerso na realidade e o mundo físico é o contexto em que ele atua. Se o pensamento é sua ferramenta de sobrevivência, é essencial que se esteja pensando e decidindo com base no que é real. A construção de argumentos lógicos e o raciocínio analítico só contribuem à vida quando são aplicados a fatos reais. A Razão é a faculdade de identificar os fatos da realidade.

O exercício da razão engloba desde identificações simples do que é perceptível e evidente, tal como o fato de que o céu é azul, até identificações envolvendo abstrações de altíssima ordem, que por sua vez dependem de inúmeras abstrações e identificações precedentes e do exercício rigoroso da não-contradição.

Um exemplo de identificação não evidente é o fato de que o salário mínimo causa desemprego, uma identificação que depende de tantos outros conceitos e identificações que requer um artigo dedicado para apresentá-la (prometo abordar o assunto futuramente, ao tratar de Política e Economia).

O ser humano tem a capacidade de imaginar, de formar em sua mente uma imagem da realidade diferente de como ela é. Esta capacidade é de valor inestimável pois é ela que possibilita nosso contínuo desenvolvimento. A imaginação permite ao ser racional visualizar a realidade como ela poderia ser. Para que o pensamento humano lhe seja útil é essencial, no entanto, lidar com a realidade como ela é. A imaginação só permite identificar o que se deseja alcançar.

A Honestidade é o princípio de sempre lidar com a realidade como ela é, o que é essencial ao tentar mudá-la. Em sua raiz está o fato de que não pensar sobre alguma coisa ou fingir que ela não existe não muda os fatos. Violar o princípio da honestidade significa tentar mudar a realidade pela simples vontade.

Embora a Honestidade seja sempre tratada apenas como algo relevante no relacionamento entre pessoas, ela é essencial para a própria ação do indivíduo. Um náufrago em uma ilha deserta, se for honesto, reconhece que sua situação é perigosa e que sua sobrevivência dependerá diretamente de suas próprias ações. Ele procurará prover abrigo e sustento para si de imediato e procurará também deixar preparados meios de chamar a atenção de qualquer embarcação ou avião que venha a passar por lá.

Outro náufrago pode se convencer que com certeza o acidente que o jogou nesta situação não passou desapercebido. Pode se convencer que certamente o resgate está a caminho. Pode se convencer que tudo vai se resolver logo, que no fim tudo dá certo. Se estas idéias não são fundamentadas na realidade, se não há evidência alguma de resgate fora de sua imaginação, este náufrago está violando o princípio da Honestidade.

O primeiro náufrago agirá com toda a energia para se preparar para a vida naquelas condições. Não poupará esforço em prover suas necessidades, pensando no longo prazo. O segundo está esperando ser salvo a qualquer instante. Este se dedicará a resolver problemas imediatos, mas não está aplicando sua mente na solução do problema real: como sobreviver naquela ilha por um longo tempo.

Para o primeiro náufrago, cada dia que passa é um dia de conquista, um dia em que ele venceu suas dificuldades, atingiu seus objetivos. Para o segundo, cada dia é uma frustração, mais um dia em que o universo se mostrou injusto para com ele. Não é difícil ver como a Honestidade ajuda o primeiro a viver, e como sua falta prejudica o segundo.

Na vida normal, longe de acidentes náuticos, a Honestidade é sim algo essencial no relacionamento com outras pessoas, no entanto ela é primariamente uma virtude ligada a como se lida com o mundo. A Honestidade na interação com outras pessoas é conseqüência do princípio geral e mais amplo.